segunda-feira, 13 de maio de 2013

Um estranho no espelho


Sempre gostei de coisas assustadoras. Era daquele tipo totalmente cética, sempre buscando um desafio para por a prova o sobrenatural. Precisava disto e muitas vezes sequer entendia o porquê, era só um desejo de reafirmar o que eu pensava e talvez, no fundo, uma vontade de descobrir que havia algo mais.

Já tinha tentado parar com estas experiências um milhão de vezes, principalmente por causa de minha mãe, que não via com bons olhos esse meu interesse. Mas quando dava por mim, lá estava eu buscando, em algum site ou livro ocultista, uma idéia para por em prática esse meu estranho vício e, o que posso dizer, foi exatamente isto que ocorreu naquela tarde.

Era uma sexta- feira completamente normal. Voltei da escola e estava almoçando tranquilamente com meu irmão, quando minha mãe veio avisar que sairia com seu novo namorado. Aff, isto era um saco! Desde o seu divórcio, ela vinha saindo e acabava que eu que tinha que bancar a babá, mas naquele dia foi diferente, meu irmão pediu pra dormir na casa de um colega e já que mamãe deixou, eu passaria a noite sozinha.

Logo tive a idéia de aproveitar esse tempo e fazer alguma coisa pra testar meu medo, comecei a pesquisar e descobri algo muito interessante. Chamava-se ilusão do estranho no espelho e era muito simples, consistia em olhar seu reflexo de certa distância, iluminado apenas por uma luz atrás de você e, mesmo o site afirmando que se tratava apenas de uma ilusão, garantia que poderiam ser vistos monstros ou pessoas já falecidas. Assim decidi que era isto que eu faria naquela noite.

Eram 19 horas quando finalmente minha família saiu, depois de me despedir deles resolvi começar. Acendi uma vela e a coloquei numa prateleira que ficava de frente para o espelho do banheiro, apaguei a luz e comecei a encarar minha imagem.

Os minutos passaram, não sei dizer quantos, mas já estava desconfiando de que, como na maioria das vezes, nada aconteceria. Foi então que cometi meu maior erro, me aproximei do espelho, mesmo sabendo que deveria dar um espaço de 40 cm. Tornei a observar meu rosto, agora estranhamente com mais atenção, não sabia exatamente o porquê, mas toda aquela atmosfera estava me absorvendo.

Quando me dei conta, algo muito esquisito acontecia, era como se meu reflexo não acompanhasse meus movimentos, mas, diferente do que se espera, não fiquei com medo, pelo contrário, estava cada vez mais absorta no que via. Até que no meu momento de mais atenção, algo terrível aconteceu, a eu do espelho deu um sorriso totalmente demoníaco que me tirou do estado de quase transe, me fazendo bater violentamente com a cabeça na parede atrás de mim e desmaiar em seguida.

Abri meus olhos e me encontrei deitada em uma cama de hospital, vi minha mãe de relance perto da janela vindo até mim e logo fechei novamente os olhos imaginando que ela viria reclamar do que eu estava fazendo no banheiro, mas não, ela simplesmente me abraçou perguntando se estava tudo bem. Acho que o susto a fez esquecer-se da vela e eu preferi não tocar no assunto.

Pelo restante do dia não deixava de ter a sensação de que algo estava estranhamente errado, era como se o mundo ao meu redor estivesse diferente. Porém me disseram que era por ter passado a noite inconsciente e que por estar tudo certo teria alta no final da tarde. Assim minha mãe ligou para seu namorado que logo chegou para nos buscar.

Ao ver o carro notei algo engraçado, era um carro popular brasileiro, mas no modelo inglês, em que o volante fica do lado oposto ao que estamos acostumados. Tentei lançar um comentário sobre isso ser legal, mas fui respondida com um seco obrigado e achei melhor deixar isso pra lá. Devo ter dormido a maior parte do percurso até minha casa, por que só quando cheguei que tive a certeza que estava perdida.

Sai do carro em desespero ao ver que o numero do portão estava escrito de forma estranha, entrei em casa e tudo parecia no lugar errado, tudo invertido. Olhei um jornal e não conseguia entender o que estava escrito, as pessoas já estava se assustando com a minha reação. Me veio um bolo na garganta e uma vontade de chorar, corri pro banheiro e abaixei pra lavar o rosto e só então me veio na cabeça que estava aonde tudo devia ter começado, tomei coragem e levantei a cabeça só para ter a pior confirmação de todas: Meu próprio rosto no espelho rindo daquela familiar forma sinistra.

Já faz anos que estou neste mundo e bem, posso dizer que me acostumei. Já passei da fase de tentar voltar e hoje apenas evito olhar pro espelho, evito lembrar que alguém se passa por mim no mundo que um dia fora meu. Mas às vezes, só às vezes me pego pensando em como estão todas aquelas pessoas, amigos e familiares, que se tornaram meros reflexos.

E você, de que lado do espelho está?

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