sábado, 23 de março de 2013

Hora de Dormir (FINAL)


Isso até que eu entrei em minha casa e encontrei um grande rasto de pegadas molhadas da porta da frente de casa até minha cama.

A descrença tomou conta de mim. O desespero foi tão grande e tão forte que eu sou incapaz de transmiti-lo com palavras. Ele estava deitado em minha cama, esperando, um lençol branco cobrindo seu corpo magro.

A mente humana é uma coisa maravilhosa. Assim como você acredita que seu corpo chegou ao um nível de exaustão tão alto que não conseguirá se recuperar, que suas emoções estão tão desgastadas que você mal pode continuar, nasce um pensamento milagroso da sua cabeça cansada.

Deixe-o descansar, por enquanto.


Silenciosamente andei vagarosamente pelo escuro e peguei minha carteira que eu tinha deixado em uma pequena mesa de café no centro da minha sala de estar. Deixando a porta destrancada, eu sai tentando fazer um novo plano e voltei uma hora mais tarde. Depois do meu momento de preparação eu entrei no quarto de hospedes. Lá eu me deitei na cama imaculada, esperando. Eu tinha certeza que esse era o fim do jogo, que em vez de brincar comigo, dessa vez ele estava lá para me matar de vez. Como ele tinha escapado da "sepultura" eu não sei, mas eu estaria ferrado se ele fugisse novamente. A única coisa que eu podia esperar era que ele me sentisse do outro lado do quarto.

Fechei meus olhos fingindo que eu estava dormindo pesadamente. O tempo passou rapidamente e mesmo que eu tenha lutado contra, a exaustão me venceu, até que eu realmente dormi profundamente.

Acordei com mãos em volta do meu pescoço. Ele tossia e engasgava em cima de mim, com um líquido rançoso e negro escorrendo de seus ferimentos faciais. Lutei mesmo com a falta de ar esperando que eu tivesse a força em mim para escapar dele, mas ele era muito forte e minhas mãos não conseguia segurá-lo, pois ele estava escorregadio e molhado pelo que parecia ser pelo seu mergulho no lago.

Pode não ter parecido racional no momento, mas com minha visão escurecendo e com a última luz da minha consciência ainda dentro de mim, eu fiz como tantos animais fazem em seus últimos momentos, eu me fingi de morto.

Deitado lá sem me mexer, segurando minha respiração, ele me sacudiu violentamente pelo pescoço e depois me soltou. Esperei meu momento, minha última chance de destruir aquela coisa. Sua respiração ofegante relaxou um pouco e parecia estar olhando pra mim zombeteiramente.

Ele ficou inclinado sobre mim, cheio de desdém. Ele reuniu o máximo de saliva que sua boca pode aguentar, e então, mostrando o máximo de desprezo que tinha tanto pelos vivos e pelos mortos, cuspiu o seu líquido purulento em meu rosto, o resto ainda escorrendo pelos buracos que tinham em sua mandíbula.

Eu queria gritar, fazer qualquer coisa para tirar aquela gosma nojenta da minha pele, mas eu não arriscava me mover; essa não era a hora certa. Se aproximando mais ainda, ele cutucou a ferida no meu ombro, a dor se espalhou por todo o meu corpo. Com toda a resistência que a inda tinha, não me mexi.

Então, lentamente e pacientemente ele deslizou dois dedos longos pela minha boca. O gosto era amargo, rançoso, podre, morto. O estalar de seus dedos como se tivesse artrite fez eu pensar se aquilo que eu fazia era o certo. Ele arqueou as costas alegremente, e de repente empurrou seus dedos fundo na minha garganta.

Engasguei, uma reação instintiva.

Em vez de ficar chocado, um riso trincado emanou através de seus dentes quebrados, e então empurrou mais profundamente seus dedos em minha boca. Eu senti sua carne fria e dura raspando interior da minha garganta sem poder dizer nada para que ele parasse; como se isso de alguma forma fosse adiantar.

Nos nossos momentos mais obscuros, às vezes encontramos a nossa verdadeira força. Eu rolei para o lado e com o peso dele me ajudando, finalmente consegui me libertar. Eu caí no chão. Com o longo alcance que ele tinha ele agarrou meus pés, e eu chutei e gritei e, finalmente me vi livre. Ele olhou pra mim, só por um momento. Subindo em cima da cama, seus ossos quebradiços estalando por conta de sua própria força, ele estava agora de pé, alto e magro, pronto para me atacar.

Desde criança eu tinha sido a vítima. Tinha me aterrorizado, tirado a inocência de mim, atacou Mary e destruiu minha vida.

Eu não aceitaria mais isso.

Às vezes, a presa mais perigosa é a única que pode te despistar, aquele que pode te acalmar em uma falsa sensação de domínio ou de superioridade, aquele que nunca teve nenhum medo de você. Ele tinha caído numa armadilha, uma concebida pela lógica, a razão, e uma compreensão do mundo através dos olhos de alguém criado no meio da ciência.

Fogo purifica tudo.

Enquanto ele gritava, gemia, se contorcia preparando-se para me atacar, e eu um movimento rápido eu levantei um cobertor que estava no chão revelando um balde com gasolina que eu havia comprado no curto espaço de tem que estava me preparando para esse momento. Eu joguei o máximo que eu podia, o liquido se espalhando por todo aquela aberração em cima da cama. 

Ele sorriu para mim, zombando da minha própria existência, fazendo graça minha dor e a agonia que tinha me causado.

Do meu bolso tirei um isqueiro, o acendi, e joguei contra aquele miserável. Ele se contorcia e gritava em agonia, parte de sua carne desprendendo de seu corpo, virando cinzas na frente dos meus olhos. Eu quase senti pena dele.

Que queime!

O fogo ficou fora de controle, felizmente um vizinho ouviu os gritos e viu a fumaça, chamando os bombeiros. Eu não consigo me lembrar de como escapei.

Passei varias horas no hospital sendo tratado por inalação de fumaça e queimaduras em minhas mãos. Ainda dói quando eu escrevo, mas como a maioria dos ferimentos superficiais, esses também vão sarar. Talvez haja algumas cicatrizes, mas eu posso viver com isso.

A policia me prendeu logo depois que fui liberado do hospital, acreditando que eu era um assassino. Eles suspeitavam que eu tinha matado alguém no incêndio e acharam suspeito demais o ferimento profundo no meu ombro e os arranhões em meu corpo. Me foi dito para não ir muito longe caso eles queiram me perguntar mais alguma coisa, mas podem perguntar o que quiser, duvido que acreditem em minhas respostas. Eles não encontraram restos, ou qualquer evidencia de que alguém estivesse lá além de mim, além de um estranho esboço de uma figura gravado profundamente na cama e na parede. Parecia que qualquer coisa que estivesse lá tentou uma fuga, mas acho que não conseguiu.

Um peso já foi tirado de meus ombros, um que eu agora sei que sempre esteve lá desde minha infância. Acredito que aquela coisa tinha um certo efeito sobre mim, mesmo de longe. E agora que se foi, eu me sinto inteiro novamente.

Eu estou arrasado mesmo é por ter perdido Mary, e o resto da minha casa pode ser demolida e provavelmente vou ser acusado de incêndio criminoso quando começaram a investigar o que começou o fogo, o que significa que eu posso dar adeus a qualquer reivindicação de seguro.

Minhas mãos doem, assim como meu ombro, mas meu espírito não. Eu estou escrevendo isso direto de um quarto de hotel, ele é pequeno e despretensioso, mas ele vai servir pro meu propósito. Hoje a noite eu pretendo dormir e sonhar, como eu fazia quando criança, antes daquele maldito aparecer na minha vida.

Eu acredito que foi a minha racionalidade que me salvou, meu pensamento lógico que permitiu que eu exterminasse um mal tão forte, mas eu nunca vou poder fugir da conclusão de que há muito mais além do que se vê, do que se sabe. Existe um mundo que eu vi, e que eu não me importo de rever, mas hoje à noite eu vou descansar e amanhã vou construir minha nova vida com a confiança que o meu hóspede indesejável se foi para sempre. Eu posso sentir!

Levará algum tempo para me ajustar e talvez a minha mente brincará uma ou duas vezes comudo por esse longo caminho, pois é difícil abandonar uma paranoia que se teve a vida toda. Eu preciso aprender a aceitar o que é ter segurança de novo. Recuso-me a olhar por cima do meu ombro para o resto dos meus dias, mas serei sempre cauteloso, como quando hoje de manhã na cama do hospital quando eu achei que tinha sentido uma vibração estranha, mas eu sei que era apenas a minha imaginação.

Eu estou contente por ter escrito as minhas experiências, o que me iluminou muito sobre mim mesmo, e  que se alguém se encontra, que Deus me livre, na mesma situação que eu estive, talvez saberá o que fazer.

Agora é hora de dormir, e eu tenho que descansar pois nunca havia sentido um cansaço tão grande como esse.

Boa noite, e durmam bem...

FIM

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