quarta-feira, 6 de março de 2013

Hora de Dormir V (pt.9)


Estou tremendo enquanto escrevo isso. Eu fui liberado pela policia duas horas atrás, e eu sou obrigado a registrar os acontecimentos para lembrar dos eventos que ocorreram rapidamente do dia para a noite. Em alguns aspectos eu quero esquecer, mas eu sei que eu não posso, eu sei que eu não devo. Para minha própria sanidade eu tenho que divulgar o que aconteceu, pois é muito importante. Devo sempre me permitir a ser levado pela natureza, pela mecânica racional  do mundo, mais uma vez, essas palavras devem servir para lembrar-me do que o que é invisível é misterioso e assustador.

Depois que Mary foi embora, eu sabia que eu tinha perdido ela para sempre, mas antes de ser consumido pela depressão e pela falta de ação, eu estava me revigorando para um propósito, por um pensamento, por uma ideia que eu sabia que tinha de ser realizada.  Eu tinha que destruir a coida, porque eu não podia dar a chance de algum dia ele vir a machucar mais algum ente querido meu, ou profanar a inocência de outra criança;

Eu também sabia que eu tinha enfrentado a morte, mas o sentimento de que eu já havia perdido tudo, aquilo era um pequeno preço a ser pago. Diz-se que a vingança é um prato que se come frio mas eu tinha esperado toda a minha vida adulta para me livrar daquela coisa, da sua memória e da sombra que tinha lançado sobre mim. Eu conhecia proposição de matar esse demônio, essa força pervertida e corrompida; e faria com um sorriso na minha cara.

Naquela noite ele morreria, mesmo que eu tivesse que arrasta-lo para o inferno comigo.

Me ocupando pelas horas seguintes, eu arrumei um saco e escrevi uma carta pata Mary e minha família explicando o que tinha acontecido e que eles não eram culpados. Eu liguei para minha mãe e pai, então meu irmão, apenas para ouvir a voz deles uma última vez, mas eu não me prendi no pensamento que talvez fosse a ultima vez que falaria com eles. A intuição de minha mãe fez a perguntar se estava tudo bem, eu sorri e disse que a amava antes de dizer, relutantemente, adeus.

Por volta das 19h eu fui para o carro. O sol já tinha se posto, e a rua parecia estranhamente vazia e quieta, como se fosse acena de um funeral autônomo. Sentei-me no banco do motorista, deixando a porta do carona aberta, esperando meu passageiro indesejável.

Por volta das 21h nada fora do comum tinha acontecido, o local permanecia abandonadoe o ar frio da noite que fluia pela prota aberta estava começando a encomodar. Enquanto sentado lá, muitos pensamentos passaram pela minha mente.  Eu comecei a refletir sobre a natureza do parasita cadavérico. Uma pergunta surgiu entre um mar possibilidades, elevando-se acima de todas outras, imóvel e continua:

"Você pode matar algo que já está morto?"

Eu não sabia se a coisa tinha saído de um túmulo, oi era um fantasma de outro plano que podia ser considerado "vivo" de alguma forma, mas quando  eu estava começando a reavaliar meu plano, ele chegou.  Foi súbito de primeira, mas houve uma pequena mudança, um movimento quase indistinguível na suspensão do carro. Se tivesse sido por qualquer outra circunstancia eu nem teria notado, mas eu estava muito familiarizado com esse sentimento por todos aqueles anos, de como o beliche mudava um pouco quando a coisa subia para a cama de baixo. Eu sabia qual era o seu cartão de visita. O ar ficou mais denso como se tivesse sido contaminado por algum cadáver próximo.

Estava no carro comigo, invisível ao meus olhos, mas pelo menos estava lá. Quando ouvi o menor da respiração sussurrada vinda do banco de trás, inclinei-me lentamente e fechei a porta do carona. Eu virei a chave da ignição e arranquei o carro pela rua, e eu pude jurar que ouvi um risinho tranquilo, como se zombasse de mim.

Será que ele sabia o que eu estava planejando?

Nosso destino não era longe. Ocasionalmente, pelo caminho, eu podia ouvir algo vindo de trás, mas eu me recusava a olhar apara aquela coisa no escuro. Paciência; não demoraria muito para eu confrontá-lo.  

A ironia me bateu, eu estava tentando assustar a coisa que havia me aterrorizado e torturado por anos quando criança. Eu tinha ser invulnerável e dirigir com cuidado+ e com calma pelo campo, inundado pela escuridão, esperando que meu passageiro sobrenatural não suspeitasse de mim.

Eu cheguei.

As rodas do carro se forçaram e deslizaram pelo mato baixo conforme eu avancei pela estreita estrada do campo.  A paisagem foi se revelando enquanto eu avançava e quando eu olhava para aquelas árvores podre e o lugar vazio ao meu redor, eu percebi que tinha sido apropriado ir para um lugar tão sem vida quanto a coisa que eu pretendia destruir.

O terreno acabou bruscamente; um paredão de uma antiga pedreira que formava um alto precipício, diretamente para as águas profundas e negras de um lago logo abaixo. O terreno do precipício era relativamente plano e havia sido de fato uma estrada  para o lago décadas atrás. As crianças locais contavas histórias sobre os fantasmas vingativos dos que morreram durante a subsidência., mas eram apenas histórias. Ou talvez não eram. No passado eu não daria crédito a esse tipo de histórias, mas se eu contasse a minha agora, quem daria crédito à mim?  

Eu desliguei o motor e estacionei muitos metro de distância do precipício, desligando também qualquer luz e me preparando para o que aconteceria. Fiquei sentado no carro pelo o que pareceu ser uma vida inteira, tendo por companhia apenas o som ocasional das águas do lago lá embaixo.

Eu esperei.

A coisa era esperta, sobre isso eu não tinha dúvidas. Havia brincado comigo, levando em consideração a dor e o tomento que havia me causado, só podia ter sido executado por uma mente fria e calculista.  Por esse motivo eu achei que a coisa desconfiaria de mim, e talvez até fugisse se eu levasse o carro mais perto do precipício; eu devia espera-lo me atacar, deixa-lo se alimentar e se divertir com a minha dor e, talvez, na sua distração não notasse que eu empurrava lentamente o carro para as frias e profundas águas do lago abaixo.

Eu iria afogar o bastardo.
Calculei as consequências em minha mente e percebi que só haveria uma pequena chance para me jogar para fora do carro antes que ele caísse no precipício. Mary e eu costumávamos ir ali as vezes. Um lugar para se estar juntos longe de tudo e todos e não se parecia tão sinistro assim durante um dia de verão. Naturalmente, eu tinha o lugar em minha cabeça por conhecê-lo tão bem. A queda era de no mínimo de 15 metros até as profundezas das águas, e eu não gostaria de estar dentro do carro junto com a coisa quando o carro afundasse lá.

Eu esperei.

Então ei ouvi. Lento no começo, e então aumentando o volume e o ritmo, um respirar frio e baixo vindo do banco de trás. Estranhamente, soava mais forçado do que antes. Cada respirar uma luta, cheio de fluídos, podre e decaído. Um arrepiou desceu por minha espinha. Um cheiro terrível e pesado pairou no ar.

A respiração se aproximou por trás.

Meu coração acelerou, batendo rápido e forte quando viu o para-brisa do carro começar a gelar por dentro. Eu podia ver minha respiração, algo natural de fato, mas o que era estranho era que a respiração estava vindo do lado do meu rosto. Eu me virei lentamente, querendo chorar, e sair, correr noite adentro, mas eu tinha que ficar, eu não podia deixa-lo escapar.

Estava sentado no banco do carona.

Eu estava o encarando, e ele fazia o mesmo. Curvado na escuridão, contorcido, magrelo, suas mãos pareciam estar lutando contra atrofiação, lentamente se moveu em minha direção. Uma perna  esquelética estalou e deslizou sobre meu colo, seguida da outra.

Ah, Senhor! Ele estava sentando em mim!

Puxou-se para perto de mim e por um fino feixe de luz providenciado pela lua, pude ver seu rosto. A pele se desprendia de suas feições disformes. Olhos como vidro olhavam profundamente em minha alma conforme um sorriso tomava conta de seu rosto, anormalmente grande com o resultado da carne apodrecida, expondo músculos podre, dentes quebrados, e tendões esticados para baixo de seu sorriso rançoso.

Aproximando-se, ele abriu a boca revelando uma língua molhada e pútrida que podia ser vista através de partes de sua mandíbula que estava faltando.  Respirando pesado e ofegantemente, um cheiro terrível faziam meus olhos lacrimejarem entrou pela minha boca fazendo meu corpo se contorcer, meu corpo tentando expulsar os gases venosos, e enquanto eu fazia ele parou por um momento, e riu para si mesmo, satisfeito. Olhando para seus olhos gélidos, eles ainda me passavam a impressão de um homem velho aflito e fraco. Era incrivelmente forte, mas parecia ter perdido grande parte de seu poder.

Talvez, ter deixado o quarto estreito tinha afetado-o de algum jeito?
Seus longos e proeminentes dedos se insinuaram em direção de me rosto e, mostrando sua intenção, colocou um de seus dedos fundo em meu ombro. Gritei enquanto o apodrecido demônio  torcia e movia seu dedo dentro de mim, causando o máximo de dano e dor que podia. Conforme sua outra mão deslizava por meu corpo abaixo.

Ele me tocou.

Era a hora. Com meu braço livre eu liguei a ignição e pensei que mesmo com meu braço preso e machucado poderia lutar contra a dor, colocar o carro para rodar, e sair de lá o mais rápido que eu pudesse.

A criatura se agitou e gritou, e tentou pular para o banco de trás, mas o segurei com toda a minha força, a lembrança do que ele tinha feito com a minha Mary era o suficiente para alimentar a minha raiva. Aceleramos na direção do precipício e eu fiquei olhando para a porta do motorista freneticamente. Quando nos aproximávamos do nosso gélido mergulho, gritei em raiva para seu rosto rançoso e o empurrei para longe de mim.

Ele se jogou para o banco de trás por sua vida e eu destranquei a porta do carro lutando pela minha.

Era tarde demais, o carro caiu do precipício e antes de eu perceber, atingimos a água negra, batendo na superfície da água gelada com uma força tremenda. Eu deveria ter morrido, mas o air-bag sentiu o impacto e conteve a batida. Mesmo assim eu bati minha cabeça na porta.

Tonto, olhei ao redor. O som que eu ouvia vindo da coisa era disforme, mas ainda assim familiar. O guincho de uma criança demoníaca deu lugar a agonia e ódio vindo do daquele demônio ancestral que sabia que tinha quase enfrentado a morte.

A água estava congelante e entrava pela porta retorcida do carro com tanta força que me deixava sem fôlego. Eu lutava por ar assim como o bastardo também fazia.  Ele se contorcia e revirava enquanto procurava por uma saída. Vendo a porta aberta, se empurrou pela água em minha direção.

Cerrei meu punho e soquei a coisa bem no rosto. Pedaços de carne podre voaram sobre o impacto enquanto um líquido negro vazava do ferimento resultante.
De novo ele tentou passar por mim e eu soube que para mantê-lo no carro, por tento suficiente para afoga-lo, eu deveria morrer junto. Senti meu corpo anestesiado quando a água gelada atingiu meu queixo, meu coração lutava conta o frio e de súbito eu afundei segurando a minha última respiração em meus pulmões.

Segurei minha respiração, mas apenas para me preparar para uma gélida e sufocante morte. Esperava que não fosse dolorida. Meus pensamentos retornaram para Mary e minha família, e todo o tipo de tristeza e agonia que já havia algum dia me consumido, tomou novamente conta de mim, mas mantive forças e não permiti que a coisa passasse por mim e chegasse até a porta, segurando e lutando contra seus braços, olhei para baixo e eu vi.

Sua perna estava presa entre um banco e o chão do carro devido ao impacto da queda e, apesar de poder se mexer, não conseguiria sair.

Eu me virei imediatamente para a porta, mal podendo ver um metro a minha frente naquela água negra, mas havia o suficiente de luz vindo da lua para guiar meu caminho. Assim que eu cheguei a porta, o infeliz me agarrou e me puxou de volta para perto dele. Ele havia perdido a esperança de se salvar então queria que eu me afogasse com ele.

Nós lutamos pelo o que parecia ser uma década naquela gelada e amarga sepultura que era meu carro, lentamente afundando e afundando dentro da escuridão do lago. Eu sentia meu corpo implorando por ar, querendo expelir o pouco de ar que ainda havia em meus pulmões e engolir a água gélida.

Eu estou feliz em dizer que usei minha inteligência para sair daquele destino tão horrível. Orientando meu corpo, empurrei meus pés contra o painel do carro com força o suficiente para conseguir, finalmente, escapar das mãos escorregadias dele. Não lembro mais de muita coisa além de ouvir último grito de ódio do meu inimigo que ficou para morrer afogado no fundo daquele lago gelado.

Eu me vi caminhando pelo deserto frio, molhado, mas vivo. O ferimento no ombro me desacelerou, mas eu mantive o sangramento controlado pressionando com a minha outra mão. Levei mais ou menos duas horas para chegar em casa a pé, eu estou surpreso por não ter entrado em um colapso por exaustão oi hipotermia. Quando eu vi minha rua, tão familiar para mim, um sentimento de realização me preencheu. Um sentimento de orgulho e triunfo.

Eu tinha derrotado aquela coisa de uma vez por todas!

(ÚLTIMA PARTE EM BREVE!)

Nenhum comentário:

Postar um comentário